Para nós, o conceito de cultura esteve sempre intrinsecamente ligado com o conceito de justiça, bem
como
ao direito irrevogável que a nossa comunidade tem de se afirmar, aprender, falhar, questionar-se ou
evoluir de forma igual, no contexto do país e do mundo.
Decidimos assim iniciar esta nova era com um manifesto que define um conjunto de compromissos e
motivações, para que possamos estar intimamente comprometidos com o lugar, que durante estes anos,
nos
deu o melhor que temos.
Em 2010, dava início uma década que se adivinhava prolifera e fértil a nível cultural para a cidade
que nos viu crescer. Deu-se ainda o aparecimento de instituições e coletivos com projetos sérios e
fortificados, para criar uma base sólida, num panorama cultural que era praticamente inexistente e
de dinâmica limitada.
A raíz da INDIEROR nasceu, antes de várias metamorfoses, com um manifesto multimédia, que partia da
vontade de não deixar enfraquecer esse impulso, e criar oportunidades junto daqueles que viam os
seus esforços secar em terra infértil.
Pelas mãos passaram-nos centenas de projetos, milhares de jovens, inúmeras dores de crescimento e
histórias que nos parecem um sonho lúcido, que é já impossível de apagar na história da nossa cidade
e região.
O nosso nome ecoou no país e no mundo. Falou-se do "lugar onde a música acontece", de
"empreendedorismo jovem no interior", de "acesso à cultura", do "combate à desertificação", de
"cultura em comunidade", de "utopias que vão de Nova Iorque a Trás-Os-Montes" e de "provas de vida
neste lugar".
Provas de vida que acolheram essa utopia e a transformaram em algo seu, que elevaram a auto-estima
de uma comunidade, que voltou a acreditar em atos de realização impossível.
Por nós e pelos inúmeros companheiros que fizeram cultura de guerrilha junto a nós nesta última
década, a cidade está de facto diferente.
Com o fim deste período, estamos a assistir ao desenvolvimento de projetos embrionários, que prometem
trazer novas dinâmicas e novas utopias. Jovens que surgem com uma rejuvenescida vontade de romper o
padrão e de questionar métodos de desenvolvimento cultural. Tornou-se, portanto, imperativo para a
INDIEROR questionar a sua própria relevância e metodologia, para poder encontrar o seu espaço nesta
nova era com a qual pretendemos continuar a crescer, junto de novas e entusiasmantes oportunidades.
Nesta retrospetiva, foi notório que as razões pelas quais iniciámos este caminho continuam a ser as
mesmas que ainda hoje nos motivam.
Para nós, o conceito de cultura esteve sempre intrinsecamente ligado com o conceito de justiça, bem
como ao direito irrevogável que a nossa comunidade tem de se afirmar, aprender, falhar,
questionar-se ou evoluir de forma igual, no contexto do país e do mundo.
Pautamos a nossa jornada pela luta incansável em munir as pessoas que nos rodeiam de ferramentas,
para que possam crescer e viver neste lugar, com as oportunidades e garantias que lhes são devidas;
de as confrontar com novos mundos, culturas, contextos e experiências.
Num país que fala de descentralização atrás da secretária de uma capital distante, do combate à
desertificação com políticas obsoletas e no apoio à cultura em territórios de baixa densidade -
descredibilizando agentes e promotores locais -, continuamos a acreditar que a nossa missão é
relevante.
Decidimos assim iniciar esta nova era com um manifesto que define um conjunto de compromissos e
motivações, para que possamos estar intimamente comprometidos com o lugar, que durante estes anos,
nos deu o melhor que temos.
Inspirados pelo olhar apaixonado que Miguel Torga tinha pela nossa região, estes compromissos
definem assim a nova linha de identidade e programação da INDIEROR para a próxima década:
1. "O universal é o local sem paredes"
Escreveu-o o poeta em "Diário" e define, irrepreensivelmente, o lugar de um transmontano que se
insere no mundo sem paredes. Este primeiro compromisso da INDIEROR pretende potenciar esta visão e
criar condições e oportunidades de ensino, educação, aprendizagem e proliferação de iniciativas
locais ligadas à cultura, munindo jovens locais da capacidade de derrubar muros num mundo que tende
a cria-los. Queremos “rebentar a bolha” e fazer as novas gerações entender que o local não os
limita, tornando-as capazes de enfrentar desafios à escala mundial. Nas áreas da música, da dança,
do teatro, das artes plásticas ou dos novos media, assumimos o compromisso de derrubar as paredes
que nos possam limitar.
2. "O mundo é uma realidade universal, desarticulada em biliões de realidades individuais"
Também na mesma obra, Torga relembra-nos que, dentro de cada mundo, há inúmeras peculiaridades e
contextos que nos tornam únicos.
Com este segundo compromisso, pretendemos confrontar realidades e trazer, para junto da nossa
comunidade, novas formas de olhar o mundo: seja pela presença de artistas internacionais, que nos
permitem comparar e estabelecer novas relações com culturas distantes; ou pela partilha de histórias
e lutas com artistas e entidades nacionais com as quais podemos todos aprender.
A INDIEROR compromete-se assim a afastar-se de formas de programação padronizadas, impostas pela
indústria e que pouco acrescentam de relevante às dinâmicas da comunidade em que nos inserimos.
Assumindo uma atitude que olha a cultura como ferramenta de mudança e construção, pretendemos
colocar os artistas e agentes culturais em intercâmbio direto com as pessoas, convidando-os a viver
a cidade e a conviver com as suas gentes. Sem barreiras e filtros, numa comunicação aberta e de
evolução mútua, que excede os limites do palco e nos aproxima enquanto pessoas.
A INDIEROR dá assim início a uma nova fase que promete estimular descobertas e encontros que se
perpetuarão por várias gerações e com foco no futuro.
"Por todos aqueles cujos sonhos morrem na quinta classe"
David Keenan